Há algum tempo quero escrever um texto sobre como a Inteligência Artificial (IA) vem sendo usada em áreas em que, há algum tempo atrás, nem mesmo sonharíamos: de um mero suporte a tomada de decisões, avançando para um “assistente” para tomada de decisões criativas, vemos hoje algoritmos capazes de criar, de gerar algo novo a partir de alguma entrada de texto (prompt). Parece-me que computadores estão finalmente derrubando a barreira do “somente humanos podem ser criativos”.
Claro, se você observar de forma mais aprofundada, perceberá que o que ela está fazendo é replicando padrões que “se encaixem” e encaixem no contexto solicitado pelo usuário. O computador ainda não “entende” sobre o que está escrevendo ou desenhando, mas eu não me surpreenderia se nas próximas duas décadas alcancemos algoritmos capazes de realmente compreender o que estão fazendo – entra aqui um conceito que chamamos de singularidade, segundo o qual teríamos computadores com um nível de raciocínio similar ao de um humano, capazes de aprender da forma que aprendemos (quem quiser entender mais sobre, recomendo acompanhar os trabalhos de Kurzweil). Talvez você considere que estamos muito longe disso, mas observando os rumores e a quantidade de projetos bilionários em desenvolvimento de forma secreta por grandes empresas de Tecnologia da Informação (TI)… É, talvez não estejamos tão longe assim.
Dentre algumas das aplicações de IA em áreas criativas, já temos aplicativos capazes de criar artigos, histórias, imagens e até vídeos. Alguns até já discutem se não poderíamos ter jogos criados pelo próprio computador. Claro, nem todos esses projetos encontram-se no mesmo nível de amadurecimento, mas já há grandes avanços.
IA pode realmente criar?
Como um exemplo, há 04 dias atrás (mais precisamente, dia 29 de novembro de 2022), decidi testar algumas ferramentas baseadas em IA que adquiri recentemente e ver o que elas poderiam fazer em torno do seguinte prompt (entrada de dado textual oferecida à ferramenta): the clown warrior fighting a flying dragon (traduzindo: o palhaço guerreiro lutando contra um dragão voador). Segue o processo de criação que utilizei:
- Na criação da arte (uma única imagem, deveria ter criado mais!), usei o SuperMachine.art;
- Na criação da história, utilizei o Rytr.me (caso de uso: Story Plot, estendendo o texto uma vez usando a opção Continue Ryting);
- Depois, traduzi o texto para português usando o Translate.Google.com;
- Converti todo o texto para áudio (text-to-speech) por meio do Blakify.com;
- E, por fim, usei uma versão desktop do Active Presenter para criar o vídeo.
O resultado final pode ser visto no seguinte vídeo:
Como a ferramenta Rytr está “calibrada” para escrever esboços da história (plots) percebe-se que o resultado final precisa de alguma edição, mas se percebe também o quanto essas ferramentas já são capazes de criar – tudo a partir de treinamento não supervisionado (na verdade, acredito que parcialmente supervisionado, para conseguir resultados tão bons assim) por meio de milhares ou milhões de textos e imagens disponíveis na Internet.
Acompanhando discussões na web, quem já possui mais experiência fala bastante sobre a importância de escrever prompts adequados e coerentes para essas ferramentas a fim de alcançar resultados realmente bons. Lembre-se: garbage in, garbage out (traduzindo: lixo entra, lixo sai). Um website em que você pode encontrar belas imagens e exemplos de prompts para aprender mais sobre geração de imagens por IA é o PromptHero.com.
IA e Direitos Autorais
Claro, conforme essas ferramentas são aperfeiçoadas e conseguem gerar resultados melhores, começa a assustar pessoas que trabalham em áreas criativas, como artistas gráficos, designers, arquitetos (já vi algumas imagens de design arquitetônico muito boas que podem preocupar certos profissionais!) e escritores. Muitos já perguntam se o que essas ferramentas fazem não é puramente um plágio, cópia do trabalho de terceiros.
Essa é uma pergunta bastante polêmica e desafiadora. Vamos refletir sobre o seguinte tema: se eu, enquanto aprendiz de ilustrador, passo anos estudando o estilo de um célebre ilustrador e consigo criar novas artes seguindo um estilo parecido com o dele… estou plagiando ou usando seu trabalho como inspiração?
Essa reflexão é ponto-chave para podermos investigar se o que essas ferramentas fazem é plágio ou não. Se você considerar plágio como sendo a cópia direta de algo, mesmo que somente uma pequena porção, então se a ferramenta copia diretamente uma pequena parte, então é plágio. Mas se você considerar que mesmo alterada, mesmo criada visualmente diferente, a mera inspiração também é plágio, então todos nós plagiamos, não somente as máquinas.
Curioso para saber quão parecida (ou copiada) uma arte gerada por IA pode ser, decidi fazer aqui um novo teste – gerei uma imagem (orientação paisagem) para o prompt “a beautiful sunset in a beach, Artstation, Anime” (traduzindo: um belo pôr do sol em uma praia, [estilo] Artstation, Anime). Abaixo você confere o resultado:
Fiquei impressionado com a qualidade da imagem, mas ao mesmo tempo intrigado se eu encontraria uma imagem igual a esta na web. Usei então a opção do Google Search para buscar por imagens similares a esta e aqui está o resultado retornado:
Incrível e um pouco assustador: não encontrei nenhuma imagem idêntica, porém diversas imagens usando esquemas de cores similares, um “tema” similar e perspectivas até próximas, mas não as mesmas. A julgar por estas imagens disponíveis na web, o algoritmo realmente “aprendeu” sobre a forma de desenho de cada elemento na imagem (sol, nuvens, ondas, água, areia da praia, encosta etc.) e ajustou-os segundo uma perspectiva inicial oferecida. Não me parece plágio, parece-me o trabalho de alguém que estudou vários estilos e então replicou o que aprendeu em seu trabalho.
Risco = Ameaça x Oportunidade
O que estamos abordando aqui não é novidade: aconteceu durante a intensa mecanização da agricultura, a automação/robotização da indústria e a automação em massa de vários setores da área de prestação de serviços (marketing, vendas, logística etc.). A diferença é que está afetando setores que não imaginaríamos 15 ou 20 anos atrás, o que se torna um risco.
Mas você precisa lembrar que risco representa tanto ameaça quanto oportunidade. Você pode enxergar o copo “meio cheio” ou “meio vazio”, cabe a você interpretá-lo. Como “copo meio cheio”, você pode considerar que estas ferramentas servirão como suporte para pessoas que trabalham em áreas criativas para gerarem trabalhos ainda melhores em um tempo menor. Pense nisso como um “assistente virtual” para um escritor, ilustrador, marqueteiro ou outro profissional que precisa criar novos conteúdos.
A título de experimento e aprendizado, decidi criar junto com meu filho um pequeno livro de ficção. Nosso objetivo é gerar toda a história (organizada em três capítulos) por meio de prompts nas ferramentas supracitadas e disponibilizá-lo gratuitamente, incluindo um quarto capítulo comentando o processo de criação. E posso dizer que como experimento para aprendizagem está sendo bastante valioso – o resultado final deve ser publicado nas próximas semanas.
E qual a sua opinião sobre as novas ferramentas baseadas em IA e uso em processos de criação de conteúdo?